segunda-feira, 28 de março de 2011

E o nu artístico?

Com a publicação do último post  veio a pergunta inevitável: E o nu artístico?

A vulgarização da imagem da mulher e a supervalorização do corpo nos mostram que todos os sentidos estão aumentados em proporções nunca imaginadas, não apenas na pintura e escultura, mas no cinema, teatro e televisão. Sempre foi assim?

O nu nas artes plásticas tem sido a temática mais recorrente encontrada ao longo da História da Arte desde a “Vênus de Willendorf”, escultura do período pré-histórico que inclusive usei para ilustrar o texto anterior.

As primeiras representações de nus com uma finalidade estética surgiram na Grécia Antiga. É sempre de causar espanto a precisão da figura humana na Arte Grega, uma vez que sabemos que lhes era proibido o estudo da anatomia humana.

A Mitologia grega era composta por figuras antropomórficas, seres perfeitos que o homem tentava igualar. A preocupação com as proporções levaria os artistas a estudos e observações dos corpos de atletas para chegar à criação do nu idealizado, saindo do plano da representação realista para a busca de um ideal de beleza. Esta busca pela perfeição levou à instituição de um verdadeiro culto do corpo de proporções ideais que as esculturas de Fídias, Praxíteles e outros artistas plasmaram no mármore e no bronze.

Também nos desenhos dos velhos mestres, anteriores ao século XX, percebe-se que este tipo de desenho continuaria sendo feito por observação. Durante o Renascimento, com a institucionalização do ensino de arte através das academias, a representação de nus passou a fazer parte da formação de pintores e escultores.   
     
Apesar destes registros históricos, é interessante analisarmos a coerência de alguns trechos do artigo de Luciana Gruppelli Loponte, intitulado "Sexualidades, artes visuais e poder: pedagogias visuais do feminino" :

“Na história da arte ocidental, os corpos femininos são um tema recorrente, construindo e consolidando através de pinturas e esculturas um olhar masculino sobre a imagem das mulheres.

John Berger, por exemplo, argumenta o quanto a representação das mulheres na arte ocidental solidifica uma imagem feminina de passividade, de submissão a um olhar masculino, tanto do artista quanto do espectador preferencial -"os homens atuam e as mulheres aparecem". Para ele, ”o protagonista principal dessas obras, um suposto espectador masculino para o qual a obra é endereçada (tanto como espectador como possível comprador), nunca é pintado. A mulher é o motivo principal do nu como gênero da pintura a óleo européia, mesmo quando o tema a ser representado é uma alegoria ou história mítica.”

Continuando Loponte salienta:

“A sexualidade não é algo 'dado' pela natureza, que esteja simplesmente ancorado em um corpo, que é vivido da mesma forma em todas as épocas e lugares.”

Realmente, hoje a sexualidade se mostra completamente banalizada e a linha que demarca os limites da arte erótica há muito foram ultrapassados.

Eu pessoalmente acredito que quando falamos em arte, temos que pressupor a livre expressão, entretanto esta mesma liberdade me dá o direito de dizer não à banalidade imposta, disfarçada de arte - hipocrisia comercial.

Fátima Seehagen
Interferência Fotográfica sobre original de Waldemar Seehagen

quinta-feira, 17 de março de 2011

A mulher na arte... a arte na mulher


As formas femininas povoam os ideais dos artistas desde tempos imemoriais. E como compreender o sentido da arte na mulher?

Durante boa parte da história da arte vamos encontrar a imagem da mulher como representação do conceito terreno do amor, da fertilidade, da maternidade, da sensualidade e até muitas vezes, da futilidade.

Durante os séculos XVI e XVII, a arte desempenhou um papel importante na sociedade aristocrática e eclesiástica européia. Nesta época os pintores, homens por sinal, altamente treinados, tinham como seus patronos os líderes políticos, religiosos, científicos, e intelectuais. Deste período encontramos registros da arte de algumas poucas mulheres como Judith Leyster  e Rachel Ruysch .

Algum tempo depois, já no século XVIII, a idade da Razão, algumas mulheres conseguiram se destacar nos salões de arte de Paris, entretanto por um breve período de tempo.

No século XIX, quando mudanças sociais radicais afetaram a vida das mulheres, em ambos os lados do Atlântico, Mary Cassatt e Camille Claudel transferiram para os seus trabalhos o drama complexo de artistas. Artistas essas que, sendo mulheres, se viam restritas a confinarem-se aos conceitos impostos pelos preconceitos da época.

A primeira metade do século XX viu mudanças tecnológicas, filosóficas e artísticas muito grandes. A guerra alterara a maneira com que os povos vivenciavam o mundo em torno deles, mas ainda assim, são poucas as mulheres que deixaram de ser meros modelos para serem modeladoras.

Também, o geneticista Decio Altimari analisa a trajetória da mulher na arte por este mesmo viés: "a mulher na arte foi representada naquelas todas maneiras em que é ou musa inspiradora, ou veículo de alegorias (da Paz, da Justiça, da Ira, da Avareza, da Dúvida, da Guerra, da Ciência, da Fé, da Esperança, da Caridade, da Luxúria, da Peste e até da morte) ou, sobretudo, a atriz principal do milagroso mistério da reprodução na maternidade”.

Enfim, dentro do fazer artístico, no decorrer de tantos séculos, a mulher, enquanto criadora, permaneceu na maioria das vezes, uma excentricidade, embora este cenário aponte para mudanças radicais na contemporaneidade.

Mas qual seria a real potencialidade da mulher na arte?

O artista é, antes de tudo, um artesão: faz aparecer no espaço palpável e perceptível aquilo que antes era coisa imaginada. O gesto que se torna cor e dança, verbo e musica, movimento e quietude, em espantosa transmutação, desperta sentidos adormecidos na busca da experiência estética e constitui um terreno propício para o crescimento tanto individual como coletivo da feminilidade uma vez que permite que seus talentos internos aflorem.

Sendo assim, a própria mulher, dotada das capacidades de intuição que lhe são inerentes, repleta de conteúdo, irá descobrir a verdadeira medida do valor da mulher na arte e da arte na mulher. Cabe a ela, mais uma vez, lançar os alicerces para uma arte soberana, que mereça ser refletida e celebrada.


segunda-feira, 14 de março de 2011

Fátima Seehagen
acrílica e aerografia
sobre alumínio escovado
Uma amiga comentou o post anterior:
“ Você está pintando com palavras!”

Fiquei remoendo as palavras e cheguei à conclusão que é o mesmo que escrever com cores!

Quando o artista pinta algo, escreve em sua tela os seus sentimentos, pedacinhos de sonhos, de invenções, um monte de pedacinhos de tudo que sozinhos podem significar quase nada e juntos possuem uma sonoridade multicor que pode ser ensurdecedora! É a palavra pintada.

Então se tomo do mundo palavras coloridas, um amor assim todo azul, uma alegria meio púrpura e um pedaço de saudade acinzentada posso escrever colorido. Pintar com palavras.

Assim, simples – arte à procura da beleza que apele diretamente aos sentimentos mais puros do ser humano, sem passagem pela lógica ou pela razão.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Borboleta

Parada ali, mal tocando as pétalas, deixava, calada, suas impressões:

Primeiro as asas batiam freneticamente como se aplaudissem a beleza da flor.
Depois, mais calma, as asas repousavam como se fossem mãos postas em uma prece de agradecimento.
Por último, um ligeiro tremor tomou conta de todo o seu corpo:
desenhava no ar figuras e signos só perceptíveis aos loucos, às crianças e aos apaixonados.